De casa

A humanidade tem uma longa relação com cadeiras. Elas são um pouco o que somos, ganham significado. A cadeira presidencial que, muitas vezes, é mais inteligente que o presidente. A cadeira do chefe, sempre tão imponente quanto giratória. Quem não se lembra da cadeira do papai? Ela tinha algo de preferencial, um lugar especial da casa. Acho que as cadeiras de dentista foram ficando mais e mais sofisticadas porque são isso, de dentistas. Ninguém quer sentar ali. Já nos tronos (as cadeiras de reis), esses são cercados de saramaleques, nem todos são realmente reais. Cadeira de praia, o ventinho no rosto, paisagem à frente, hum? A cadeira de bebê é uma geringonça que parece que vai machucar a criança. A cadeira elétrica é tétrica. Cadeira de balanço, que vem equipada com sono e bocejo. Cadeira de palha que para ser bem usada ter que ser virada, se utilizando a parte de traz como apoio para os braços. Tem a dor nas cadeiras, mas talvez isso seja assunto diferente, como diverso é o samba “mexe as cadeira, mulé”. Cadeiras de consultório, de decoração, de escritório, de repartição. Cadeiras frufru, de massagem, de passagem, de escrever e, finalmente, nossa cadeira de ler. Tem que ter. Até para não ler, para ficar, para estar, para assistir, correr antes para guardar lugar. Para receber Ernestos, Josefinas, o não sei quem de sobrenome mãe. Para olhar fotos ou te ver sem me movimentar, para não estragar a cena, para para dias inteiros, incluso aí os fins de semana. Cadeiras de aproximar, de reencontrar, de rodas de conversa. Cadeiras de olhar para ver se estás. E ouvir “estou na cadeira”, assim que entre com um presente qualquer, trazido da rua. Vou direto pra lá, cadeira do abraço. Espaço de ficar. Clarice virá, junto com Simone. Eu serei Sherlock, você lerá a biografia dos Stones. Nós seremos leitura e às vezes cochilaremos ali. Não duas cadeiras. Uma cadeira. A minha cadeira de sentar contigo. ***

Publicado por

Mariel

Vale o que está escrito

14 comentários em “De casa”

  1. Mariel, cadeiras, tantas elas, e se elas pudessem contar histórias… muitas trariam-nos gerações e tantas aventuras e épocas para nos contar.
    Gostei do seu post. Um abraço.

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    1. Quantas histórias, né Irina? Eu adoro cadeiras, ricas, pobres, de boteco, de leitura, de massagem, todas são muito legais. Que bom que você gostou do tema. Abraço

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  2. Parafraseando a ultima frase do texto “A minha cadeira de sentar contigo”… acrescentaria “A minha cadeira de sentar comigo”, aquela onde realmente estamos confortavelmente connosco!
    Muito bom!

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