quandos

Quando escrevo, não penso em nada específico. Sento, me pergunto o que estou vendo, olho dentro e então descrevo o que estou vivendo. Há um lápis na minha mesa. Não é uma metáfora. É um lápis, é uma raiva, o pastel, O Jeep Ximbica do meu pai (que adoraria você) um lugar, o Papa, todos os Golden Retrievers do mundo (ou pelo menos os mais fofos) uivando em noites enluaradas. Sou um Especial do Roberto, de tantas Emoções.

Quando sofro, não pretendo que sofram por mim e nem aceito que me consolem. E se dispenso isso não é por estima musculosa. A minha é bem chinfrim, inclusive. Mas não suporto a comiseração alheia, o gesto bondoso, bem educado e elegante de quem entende o que se passa. Não entendem, nem passam. Portanto, que não se chore por alguém assim, que prefere saber de onde vem o tiro, o seco da resposta, a rasteira certa, o cotovelo na cara. O sofrimento é menor se entendo autorias.  Durante e estocada, é irritante que sintam muito por mim.  Se sentem, não é por mim, ou não me escolheriam para experimentar a lâmina. É o que é pode até parecer uma expressão serena, vinda de um autor calmo e translúcido. Ou pode ser a constatação de que uma faca enfiada dói.

Quando rio é ruidoso, quebra o silêncio de um modo espetacular. Rio em horas inadequadas também. As gargalhadas que profiro provocam dúvida, prefiro causar a interrogação a buscar respostas. Mas se ele está rindo tanto, a diversão é imensa, concluem. Ele está calmo, que pessoa sensata e serena. E ri, olha que engraçado. Meu riso não concorda com o que escrevo, mas não escrevo quando estou rindo. Só escrevo o que existe no ventre do que estou sentindo.

Quando morro é eterno. Morro inteiro. Padeço. Imolo. Grito e me sufoco. Mas é só quando morro. Nos outros dias, subscrevo ideias. Organizo eventos. Movimento a resistência. Subverto equações e durmo no leito de um riacho, vigiado por um abraço sem hora do desabraço.  Mas dada a sentença, lido, aguento, enfrento, peço, perco e parto, me partindo em mil pedaços assimétricos, parindo em mim mil partes desiguais.

Quando sou, sou inteiro. Então escrevo sou inteiro, eis o que sou, inteiro. Inteiramente descrito. Completamente oco. Particularmente ferido. Inteiro lanhado, inteiro doído, inteiro felizardo, inteiro vivido. Inteiro no escuro de um quarto. Um inteiro repetindo as dores do parto.          

Publicado por

Mariel

Vale o que está escrito

6 comentários em “quandos”

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