
Quando o silêncio envolve e o gélido se acerca da cidade portal, ocorre algo além do que se espera do frio intenso: é o som do rio que resiste abaixo do gelo, destemido, rindo tua vinda. Tudo é falta de som e esquecimento, mas ele corre, alimentando canais, igarapés, nascentes, num leito feito de vida, líquido e certo como rir ou vir. Árvores não são desimportantes. Asteriscos estão em seus postos. O cheiro da terra molhada, as águas do parque, o chá, os sinais, o entendimento, o assentar, o consentir, tudo converge. Símbolos miúdos travam guerra contra o desânimo e o mesmo tempo que traz essa sede constante e essa rotina áspera virá de mãos dadas com a estação do possível. Nada está inerte, tudo clama e a insônia reclama é por falta de sonhos que se sonham juntos.
Às vezes olho no telefone, a que horas virá o sono? Pintar um quadro no seco, hálito quente, minguas e frestas, nada há de suave. No entanto, lembro o tom da voz, um riso oculto, a sobrancelha, uma frase, um emprego que pode caber na busca. Recordo das mil noites em claro, do foguetório em cada chegada, no significado das coisas e no declarar sereno de tudo que para se entender é preciso prestar atenção na linguagem soprada, sugerida, apontada.
Tudo em nós é amor em estado de encontro. É o que se move em mim nesses dias imóveis. E te diria agora a frase de sempre, minha frase no sempre, o sempre dito. Não para dizê-la, mas porque é a expressão e o sentido da verdade. ***