
Para surpresa de zero pessoas, gosto do Fernando, o poeta de mil nomes. Acho “Destino” uma das suas obras mais ai meu Deus, que lindo. Dentro desse poema, a frase que aponta a realidade como algo que “é sempre mais ou menos do que nós queremos” é um pé no queixo. Parece óbvia, vista a olho nu, mas é uma armadilha semântica. É que no português brazuca “mais ou menos” é tipo dá pro gasto, meia boca, um defeito a mais e seria impróprio para consumo humano. Mas colocando uma lupa no mais ou menos do Pessoa, penso que tem a ver com imprecisão, coisa que não é coisa nem outra coisa, um real quântico, está e não está, vive entre duas possibilidades, mais ou menos. Mais, afoga. Menos, não sacia a sede.
Escrito por Ricardo Reis, Destino é um tratado delicioso, que poderia ser servido em pratos de diversos banquetes filosóficos. Ver de longe a vida, não a interrogar por saber que ela nada tem a dizer. Afinal, respostas estão além dos deuses. Mais um pé no queixo, nocaute certo. Ainda tonto com golpes tão precisos de filosofia aplicada, a derradeira constatação se aproxima. Ele nos aconselha a “imitar o olimpo” em nossos corações. Não nos convida para ir lá, não somos deuses. Não diz para construir um, não temos o poder. Imite, é o máximo que pede. Foque na excelência do olimpo e tente algo semelhante a isso no seu coração. Então, talvez, a gente perceba que deuses não se pensam, apenas são.
Tenho andado no mais ou menos de Pessoa. É uma capoeira, não sei se é uma dança que luta ou uma luta que dança. Dias fora de foco são mais longos, talvez. Ou quem sabe a realidade seja mesmo algo mais ou menos. Juro que vi coisa diferente. Juro que acho que ela pode ser criada. ***