A respeito do tempo

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O absurdo que viraliza, a bolsa que oscila, o saldo do seu Visa. O Bolsonaro, o próximo carro, o espanto, os cursos de Esperanto, o sossego, a continuação de O Segredo, o último Kung Fu Panda, o próximo show do Wando. O escândalo da hora, a hora, o tempo, a parada militar, a primavera árabe, Lula e todos os ídolos de araque, o casual sorridente e o sisudo de fraque.

Aquele sujeito esquisito, a lembrança dos gols do Zico, o preço do palmito, a poesia ruim, as polêmicas com o Chico, zeus e os deuses infinitos. O bem maldito e o mal bem dito, os reis, os Maias, o comprimento das saias, as notas oficiais, os combos, os hashtags e os heróis da Marvel. Esquecidos ilustres, os lustres do Titanic, os sotaques, as meninas, os homens de Marte e as mulheres do interior de Minas, os tiques, o carnê do IPTU, o samba de uma nota só.

O presente, o futuro, os bifes bem passados, os amantes, os abandonados, os farsantes, a taxa Selic, a minha Montblanc, os carinhos da manhã e as conclusões bestas, tipo a maioria das Bics perderam as tampinhas azuis. Logins, senhas, redes, conta da luz. Ultrajes, fronteiras, carro do ano, amores partidos, os mocinhos, os bandidos, as ações da oi e o selo de qualidade da Friboi. Arte, bondade, emprego, verdade, ego, usinas, aviões e sossego. As latas, o luto, a esquerda os reaças. Tudo vai, tudo cai, tudo passa.

 

Nos representem

Queremos confiar em vocês, rapazes. E meninas, se comportem bem, pode ser? Pelo que vi, nenhum de vocês têm dúvida sobre qualquer assunto. Quanto a isso, por que o medo? É bom não saber, a ignorância pode ser uma maravilha. Nos inspira a pedir informações, falar com pessoas ou, pelo menos, pesquisar no Google. Também não pude deixar de notar a quantidade de opiniões definitivas que cada um é capaz de afirmar sem tirar o olho confiante e o sorriso vencedor da câmera. Do preço do tomate a vaiar ou não vaiar o Fred, vocês sabem tudo, é impressionante. Não olhem agora, mas conhecimento, sozinho, vai fazer pouca coisa por nós. É que o truque de entregar espelhinho e levar o ouro meio que ficou manjado e agora queremos confiar. Eu confio em quem tem dúvidas, em gente capaz de se referenciar na humanidade e não em si mesmo, em pessoas que não possuem todas as respostas. Não confundam isso com amadores, aventureiros e os picareta (não usei o “s” para ser sutil) que lotearam o Brasil. Falo de brasileiros, essas almas gentis que vocês desaprenderam a fazer parte. Conto dessa tribo capaz de dividir os segredos das matas, as mesmas que vocês foram capazes de vender por um punhado de papel de valor duvidoso. Descrevo uma torcida, queremos nos abraçar a vocês, caso sejam de verdade. Sei, é uma pleonasmo usar verdade e candidatos na mesma frase, mas sempre fui abusado. Meninos e meninas, o poder vai marca-los. Dilma ficou ressentida, não ergueram a ela as estátuas que julga merecer. Lula a chamou de poste que ilumina o Brasil e parece que a conta da luz ficou salgada. Marina é a heróica. O problema com os heróis é que eles podem se deslumbrar com seus super poderes. Mas confesso que acho que vai ser divertido ver os ministros abraçando árvores antes do expediente. O Aécio é uma incógnita, parece aqueles garotos que só jogam porque são os donos da bola. Depois, me dá a impressão que antes de dormir ele liga pro FHC, pede benção e toma uma bronca. O restante é uma piada e de piada, Dunga é o bastante. Mas um dos 3 vai ganhar. Que parem de representar e comecem a nos representar. Verão que algo indescritível acontece. É quando surge um Sobral, uma Elis, um Betinho, um Romário, o Brasil. Se inspirem nos brasileiros. Os representem. Pensem neles, não por eles. Então, dentro de algum tempo, vocês verão que não sabiam todas as respostas, mas que isso não nos impediu de escolher quem sabia pra onde não estava indo.

Silêncio

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Falamos demais, enchemos a vida de palavras, devíamos poupa-la. Que lavra é essa, que pressa estranha, cadê o freio, do que estamos mesmo falando? Sobre o preço do pepino, se é genuína a prisão do Genuíno, sobre o tempo, se teremos Natal no pernil e, importantíssimo, se o Lulu Santos deveria mesmo continuar no The Voice Brazil. Falamos muito sobre tantos, sobre tudo, nos sobressaltamos. Você já reparou que tem gente que ao desligar o telefone termina a conversa dizendo “nos falamos”? Há uma enorme demanda por opinião, é o que dizem por aí. Especialistas em sapatos de bico fino, pós graduados em poesia boliviana, doutores em esperanto, mestres por todos os cantos que falam, exprimem, traduzem, induzem o que devemos concluir, pensar e sentir. Parece ser uma operação de um Bope comportamental, criado especialmente exterminar qualquer possibilidade se você permanecer original ou, pelo menos, de possuir seu próprio pensamento. O fato é que temos muita malandragem e pouco Capitão Nascimento. Na dúvida, se fala, quando no fundo o que cala é mais substancial. Manchetes, terapias, videntes, colunistas, o Jabor, então, da onde ele tira tanta opinião?  Há uma falação que nos mantém inquietos. O novo lançamento, a cor do momento, a tendência, o que vem forte na estação, que tipo de margarina passar no pão, o que dizer para os filhos e dúvidas das dúvidas: leito ou mel no sucrilhos?  O que colocar na mesa, quem será a nova globeleza, a última novela, o próximo destino e -assunto dos assuntos- se o irmão da Sandi é mesmo um menino. O verdadeiro amor, a descoberta de um falso Paraguay, a mulher certa, um homem atrapalhado, o velho continente, o novo chinelo e se finalmente a Ferrari provou que Felipe não é melhor do que Barichello.  Por mim, chega, por mim, basta às palavras malditas, aquelas que existem porque vaiam. Não consigo mais ouvir o óbvio, a louvação, a falsa discussão, o argumento desconexo, e -sempre isso- ver na capa da Claudia tudo o que eu queria saber sobre sexo. Pelo silêncio criativo, pelo crivo, azar se ficar esquisito, que bom se achar bonito. Pelo senso particular, pelo bem geral da nação e pelo pensamento não declarado, vou usar mais o meu direito de ficar calado. 

Não me representam

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Estão presos, alguns deles. Alguns daqueles que pediram à esperança que vencesse o medo. Tinham segredos entre eles, como diria Caetano em seus podres poderes. Alguns choram pela falta que farão, eu imploro que não façam falta, que possamos esquece-los, não prisioneiros políticos auto intitulados, mas ladrões de galinhas e o pior tipo de meliante que existe, o dos sonhos roubados. Das coisas tristes que fizeram. Dos risos que sepultaram. Das ameaçam que os mantiveram altivos, mesmo que mortos-vivos, o que mais quero é esquece-los, seja qual for a prisão que os condene ou não. Estão lá, ainda sem entender muito o que se passa, é a história fazendo daquelas biografias a sua própria traça. Me olhem nos olhos e lhes digo: a condenação é maior do que pensam. Quem merece prisão é bandido. O que cada um de vocês terá é a derrota amarga e diária de ser esquecido. 

Marcelão Paiva no Tass

Marcelão Paiva no Marcelo Tass do Terra

Marcelão Paiva fala, desfala, diz, se contradiz e mistura divertimento com profundidade.

Quem entende os críticos de arte?

- Viu a última?  - Anrãn. Me passa o vinho?
s – Viu a última?
– Anrãn. Me passa o vinho?

 

Fosse você um trailler, que filme você seria?

Its all, pessoal

Tem gente que não gosta, acho que a maioria. Eu adoro traillers, aqueles resumos do argumento geral, as cenas importantes, falas hilárias ou sérias que dão o tom do todo. Procuro chegar antes para ver o que andam preparando para colocar em cartaz. A voz profunda do locutor dizendo “um filme que você não pode perder”. Perco a maioria, mas se algum daqueles instantes que antecedem o filme me interessam, estou fisgado. Fico de olho para saber quando o “em breve” chegou e finalmente é possível ver a projeção completa, sem cortes, edição definitiva. Dizem que há um filminho que passa quando a pessoa está prestes a morrer. Se é verdade não sei, morrer parece que é o que acontece na última sessão e eu vou protelando a exibição enquanto posso. A declaração-padrão é algo como “passaram todas as coisas que fiz na vida naqueles segundos em que achei que morreria”. É um trailler ao contrário. Primeiro você vive “todas as coisas” e todo mundo vê. Depois vem a edição dos melhores momentos. E só você assiste. Ou seja: justo as imagens selecionadas, com seu perfil mais favorável, ações elogiáveis e sentimentos estupendos, justo isso é mostrado para quem já sabe o enredo todo e só desconhecia o final. Tem gente que é um filme chato, interminável. Você acha que chegou o fim e então aparece a plaquinha de “seis meses depois…”. Outros são rápidos demais, quase um vídeo clip e quando você começa a entender o argumento daquela vida, The End. Há quem goste de ser uma continuação. Repetem o cenas do pai, refazem as falas da mãe, reprisam os gestos da família, usando sempre a mesma trilha e o enquadramento geral. Remakes, originais, previsíveis, geniais, adoramos filmes porque normalmente a vida ali tem 20 minutos de tempo ruim e no fim aparecem os créditos, nunca os débitos. Depois, como em Um Lugar Chamado Notting Hill, você pode se dar bem com a Júlia Roberts, mesmo que seu nome seja Hugh Grant. Em Casablanca, o Rick  abre  mão do amor da sua vida, age como se isso não fosse o fim do mundo e ainda por cima consegue dizer adeus com um “sempre teremos Paris” para ninguém menos que a Ingrid Bergman. Eu choraria o resto dessa vida e mais duas reencarnações, balbuciando “fica, fica”. É a desvantagem de ser um filme nacional. Homens e mulheres podem ser uma película de terror, contar histórias de encontro ou simplesmente se comportarem como coadjuvantes numa história maior. Seja qual for a nossa opção (é uma opção), fomos criados para nos transformar em sucesso mundial, com diálogos incríveis, cenas hilariantes, risos, lágrimas e muitas passagens de tempo. O fantástico é que ao contrário dos atores, nosso maior risco é interpretar um personagem, acreditando em ficção, decorando falas, desenvolvendo técnicas, expressões, vivendo num cenário. Ao contrário do cinema, temos um orçamento reduzido, não podemos editar nossos dias e o roteiro muda a todo momento sem maiores avisos. De repente, o tempo grita “corta” e faremos companhia para outros títulos na prateleira. É quando faz toda a diferença ter sido o mais humano possível, o mais leal à ideia central da nossa trama. Podemos ter uma existência cult, cabeça, alternativa, dramática, romântica ou cheia de aventura, nos transformando em clássicos. Melhor não correr o risco de ouvir o locutor anunciar isso sobre nós:  “perca, não é lá essas coisas”.

Nunca fui primeira dama (ainda mais em Cuba)

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” Como é Cuba? é um te amar por todos os lados ” (Dicodallma)

Com Nadia Guerra, seu alter ego ficcional, a romancista e poeta Wendy Guerra escreve a história proibida das mulheres de Cuba. Publicado em oito países, cruza ficção e realidade no relato de uma mulher obcecada pela ideia de encontrar a mãe, que a abandonou aos dez anos de idade. Imersão num bravo mundo feminino, a busca por Albis Torres é também uma viagem a seu próprio passado e às salas escuras do regime cubano. Ao trazer a mãe de volta a Havana, resgatada em Moscou com uma doença que lhe tirou a memória, Guerra descobre em uma caixa de objetos pessoais os rascunhos de um romance que Albis escrevia sobre Celia Sánchez, secretária pessoal de Fidel Castro, heroína da revolução cubana. Rápida, às vezes triste e noutras envolvente como a alegria de uma Rumba, “Nunca Fui Primeira Dama” é um bom livro. Depois, a autora é linda e falante.