Palavra é lida

Tem palavras que se abraçam para descrever o sentido das coisas. E, talvez mais importante ainda, o sentido pelas almas. Algumas têm algo em comum, o incomum dos seus olhares e os lugares onde são vistas.

São como janelas com vista uma para a outra. Vão e vem sem desperdício da paisagem, sem necessidade de redução do visto, do bendito manifesto em orações completas e leituras do indescritível.

São palavras, só. Podem nem ser palavras sãs, mas jamais serão só palavras. Terão lavras de almas semeadas uma na outra, colheita farta, fruto bom, vento na cara, clara precipitação de chuva para terras com sede de outras águas e de novas semeaduras.

Há o perigo de horas perdidas, como as palavras não ditas. Se extinguem sem se tornarem, mesmo, um significado. Sem representarem de fato o ato seguinte, o passo adiante, a coragem de ir ou vir, o enfrentamento (violento ou afetuoso) da rotina e seus processos erosivos.  

Palavra não lida não é uma palavra não ofertada. Está aqui, entre outras tantas, também palavras, nessa quitanda de adjetivos, substantivos, provérbios e sujeitos ocultos. Inspiram quem sabe outras pessoas. Acordam recordações de outras vidas possíveis e que estiveram ali, ao alcance do sim.

Se não percebidas, perdem-se de quem não as leu, mesmo tendo destino certo e sabido. Mesmo assim, não se tornam exiladas. Se transformam em diálogos aqui. Em pensamentos ali. Descritos. Alambrados. Lustres. Lumes. Lentes. Faróis. Frio. Escuro ou denso.

Se não vistas, saltam das tuas vistas em predicados, reencarnando em contos, ideias, falas que não me passam desapercebidas. Me ocorre que ainda que não lidas, são palavras lindas. Lembram asterisco, um chuvisco, uma pipa ou um metrô. Carinhos disfarçados, presentes improváveis, porta bandeira, palavras falantes são criados mudos. Não lidas, dizem nada. Na lida, dizem tudo.